por Clara Roman
Ainda é pouco para um país tão grande,
mas já é possível dizer que hoje, no Brasil, três milhões de pessoas vivem sob
uma espécie de socialismo dentro do capitalismo. O levantamento é de Paul
Singer, secretário de Economia Solidária do Ministério do Trabalho e Emprego.
Na sexta-feira 16, ele fez um balanço sobre a parcela da população que está
inserida em programas de economia solidária (cerca de 1,6%). Ao todo, são 30
mil empreendimentos.
Centro de Abastecimento da Economia
Solidária, no 5º Fórum Social Mundial, em 2005. Toneladas de alimentos
produzidos por associações familiares devem ser consumidas durante o evento.
Foto: Marcello Casal Jr/ABr.
“É uma alternativa não capitalista ao desemprego”, diz o sociólogo e economista, em aula magna na Universidade Mackenzie.
Hoje, a economia solidária é uma das
bandeiras do Plano Brasil sem Miséria – principal programa de Dilma para
erradicação da extrema pobreza. Segundo Singer, o orçamento da pasta nunca foi
tão grande.
Até partidos que antes eram resistentes
à ideia, por considerar “coisa do PT”, estão com planos de estímulo a projetos
comunitários. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), tem estudado a
possibilidade de importar o programa para o estado.
Se hoje iniciativas como o
microcrédito, moeda social, banco comunitário e produções em cooperativas são
reconhecidas como projetos de sucesso, há pouco tempo elas passavam
despercebidas por grande parte da população, inclusive autoridades. Singer
explica: esse tipo de organização foi uma resposta ao desemprego
massivo, consequência da hiperinflação e da crise econômica no país
durante as décadas de 1980 e 1990. “Trabalhadores lutaram para ficar com a
massa falida e montar empresas cooperadas”, explica.
Singer conta que em 1988, quando fazia
parte da plataforma eleitoral da então candidata à prefeitura Luiza Erundina em
São Paulo, uma das propostas de campanha era organizar a massa de trabalhadores
desempregados (na época, cerca de um milhão e meio de pessoas) em associações
produtivas independentes. Foi quando ficou sabendo que essa ideia não era nova.
“Recebi cartas de pessoas falando que já estavam fazendo isso. O nome economia
solidária foi adotado depois”, diz.
No mundo, diversas iniciativas pipocam.
Butão, um país de 700 mil habitantes nas montanhas do Himalaia, na Ásia, será o
principal um dos principais nomes da próxima conferência internacional de
economia solidária. O país, que investe intensamente na ideia, deixará de
contabilizar seu crescimento pelo PIB. Utilizará a conceito de FIB (Felicidade
Interna Bruta), um indicador que mede não só o desenvolvimento econômico, mas a
possibilidade de tornar a sociedade mais democrática e sustentável. “É uma
fábrica de utopias, mas não é algo para quando tormarmos o poder, é para
agora”, afirma o sociólogo.
O secretário de Economia Solidária,
Paul Singer, diz que, em momentos de dificuldade, as pessoas buscam alternativas
ao modo de produção excludente. Foto: Elza Fiúza/ABr/2009
Em outubro de 2011, representantes de
62 países se reuniram em Montreal, em conferência chamada pela Organização
Internacional do Trabalho (OIT).
No Brasil, são as mulheres que lideram
o processo. “A pobreza é feminina e infantil”, diz. Comunidades quilombolas,
indígenas e extrativistas também representam boa parte dos empreendimentos.
Proporcionalmente, cidades pequenas contabilizam um grandes número de
iniciativas. Um exemplo é Guaraqueçaba, no Paraná. A cidade tem apenas sete mil
habitantes, mas 27 cooperativas e associações de economia solidária. A capital,
Curitiba, com cerca de 1.750.000 habitantes – 250 vezes o tamanho de
Guaraqueçaba – tem apenas 91 empreendimentos (pouco mais que o triplo).
Um dos princípios desse tipo de
organização econômica é a ausência de hierarquia. Em sua análise, Singer
retoma a herança militar na sociedade como uma das causas para sua
hierarquização estrita (até em esferas supostamente mais livres, como universidades).
“[A economia solidária] é uma réplica da economia brasileira sem patrão”,
afirma.
O processo,
explica ele, envolve desde trabalhadores que perderam seus empregos,
comunidades tradicionais, até engenheiros, universitários, economistas e
administradores.
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